27/02/2015

Dilema na apresentação da notícia (II)

        O apresentador da notícia em TV já não pode contentar-se em ser um leitor competente ou bom intérprete do texto que recebe; seu papel tem-se ampliado, de modo que ele precisa ser também um crítico do conjunto da obra de um noticiário, apontar erros eventuais de edição, melhorar o vocabulário, tornando-o mais preciso, objetivo e claro; fazer tudo o mais que precisa ser feito na condição de o último filtro da notícia. A responsabilidade do “novo apresentador” aumentou muito, portanto, no resultado final do noticiário que vai para o ar.
        Se as coisas funcionassem desse jeito não ocorreriam episódios tão lamentáveis como aquele em torno de uma notícia originariamente do Paraná sobre um menino, em Cascavel, no interior do Paraná, que foi atacado por um tigre enjaulado num zoológico da cidade. A fera arrancou-lhe um dos braços. O telespectador viu quando o garotinho, com menos de dez anos de idade, se aproximou da jaula e acarinhou a fera como se fosse um gatinho indefeso. O mais interessante foi ver como os vários jornais da emissora-líder cobriram o episódio.
        Primeiro caíram de pau e pedra em cima do pai do menino, que deixara o garoto sozinho e indefeso na frente da jaula da fera, como se comum fosse que as feras de zoológicos devorassem crianças de pais descuidados. Juro que fiquei à espera de um Fantástico acusando o tigre pelo ocorrido e condenando-o ao paredão de fuzilamento.
        Eu vi quando o menino se aproximou da jaula onde estava o tigre como quem se aproxima da casinha de um gatinho e acarinhou o dorso da fera. Minha reação instantânea, como jornalista experimentado que sou, foi a de condenar os responsáveis pelo zoológico por não terem providenciado total isolamento entre o público e as feras. Ver as feras não quer dizer necessariamente misturar-se à elas.
        O pior de tudo é que a “impropriedade jornalística” passou por todo mundo, repórteres, editores e apresentadores sem que ninguém a corrigisse.Consequência: o zoológico ainda está lá, presumo, como uma boa armadilha aos humanos, especialmente àqueles que gostam de viver perigosamente.


24/02/2015

O filho não herdou a sabedoria do pai

        José Richa, pai do atual governador do Paraná, Beto, era um sábio da política. Se dependesse dele jamais Álvaro Dias teria chegado ao governo do Paraná, apesar de serem originários da mesma região (Norte do estado), pertencerem ao mesmo partido (PSDB) e terem surgido para a política na mesma época.
        José Richa era daquele naipe de políticos que enxergavam um palmo acima da linha do horizonte; deve ter intuído que seu então jovem conterrâneo não conseguia enxergar nenhum centímetro acima.
        Não houve quem segurasse. Álvaro Dias chegou ao governo em tenra idade, fez uma administração barulhenta e fazia da caça aos corruptos uma perseguição de fazer inveja aos macartistas. Ódio dos corruptos, ódio também dos professores. Foi o primeiro governador a mandar a PM reprimir com violência os professores em greve. A repressão virou uma marca registrada de Álvaro Dias e que o persegue até os dias de hoje.
        Quis o destino que o segundo governador a fazer isso – mandar a polícia espancar professores – seria o seu filho, Beto Richa, eleito ao cargo pela segunda vez. Richa, o pai, morreu prematuramente há poucos anos e seu filho toca um segundo mandato meio desgovernado e, pior, sem retrovisor.
        A repressão aos professores é própria dos governos pouco inclinados ao diálogo e que não conseguem fazer uma leitura adequada da sociedade e sua organização; professor é um símbolo – o melhor de que dispomos – da civilização. Merecem eterno respeito pelo que fazem.         Nunca tiveram em nossos dias um salário digno.    

       Mandar bater neles? É sinônimo de barbárie, só isso.

 
(Joseph Mccarthy - Álvaro Dias se inspirou nele?)

22/02/2015

Dilema na apresentação da notícia

         Desde a morte de Armando Nogueira (2010) ou de sua saída da Globo, ocorrida poucos anos antes, a apresentação da notícia pela emissora-líder perde qualidade dia após dia. Sozinho, William Bonner não consegue controlar tudo e nem tem poderes para isso. Mal consegue impor qualidade mais ampla ao Jornal Nacional, onde há rumores de que tem havido alguma rebeldia ao seu poder de mando.
         William é o apresentador dos sonhos de qualquer editor-chefe: equilibrado, voz e timbre muito adequados. Começou a dar umas derrapadas durante a Copa do Mundo, mas se recompôs a tempo de não se perder  em pieguice e babaquice, que contaminaram grande parte dos demais apresentadores da emissora. Os 7 a 1 enfiados pela Alemanha na gloriosa seleção canarinho deve ter assustado a todos e servido de lição a quem se esqueceu que apresentação da notícia exige equilíbrio, em todas as circunstâncias.
         A parceira de Wiliam no jornal nacional, Renata Vasconcellos, também é um exemplo da seriedade e compostura que a função exige; nela, também, é tudo muito consistente: voz, postura, beleza (televisão é um meio das pessoas bonitas, dizem), elegância. Diria que fez uma ótima substituição a Patrícia Poeta, cuja saída repentina ninguém conseguiu entender.
         Outra que merece respeito é Leilane Neubarth, âncora magnífica da Globo News. Todos os demais, a meu ver, merecem uma orientação mais severa de cima, o que hoje não existe mais. Armando Nogueira, como eu dizia, deixou um vazio muito grande.
         Chico Pinheiro, por exemplo, tem todas as qualidades  para ser um âncora extraordinário, mas ainda vai precisar ajustar sua tendência de se dedicar com freqüência ao entretenimento, separando bem os personagens. Ele já misturou tanto sua condição de âncora com a de ator cômico que às vezes o telespectador fica sem saber quem está em sua frente – se o apresentador de uma notícia ou quem vai contar uma anedota ou um “causo” engraçado.
         O maior problema é o desequilíbrio de humor; a apresentação do Jornal Hoje, por exemplo, chega a dar gargalhadas, sem pensar que atrás de uma notícia que produz risos pode vir outra que produz lágrimas ou chocante, como algo sobre a cobertura do vírus ebola. Todos deveriam se mirar no exemplo de Renata Vasconcellos, que lê uma notícia engraçada sempre com equilíbrio, nunca de modo debochado, e está sempre preparada para sair do bom humor e passar para o trágico. É assim que tem de ser.                          Há outros aspectos do problema de modo que voltarei ao assunto em outra ocasião.


(William e Renata, exemplos) 

18/02/2015

O paraíso dos espertos!

        Fui amigo do senador Acioly Filho, na minha época de morador de Curitiba; eu me encontrava com ele de vez em quando para jogar um pouco de conversa fora e aproveitava para beber a água que ele derramava em profusão pelos poros, água de sabedoria, experiência, conhecimento. Ele era uma espécie de enciclopédia de saber jurídico, um saber esmagado pela Ditadura Militar.
        Jogar conversa fora foi força de expressão porque há muitos ensinamentos transmitidos por ele que penetraram em minha alma e ali ficaram até hoje, quase 30 anos depois da morte prematura do senador. Ele havia preparado uma reforma completa do Judiciário, a matéria ainda tramitava no Congresso, quando estive com ele para uma de nossas conversas e perguntei:

        - E se o Congresso não aprovar essa reforma o que vai acontecer com o Brasil?
      E ele respondeu com a serenidade que lhe era peculiar:
           - Um país sem Justiça se transforma num país dos espertos.
           A reforma proposta por Acioly ficou para as calendas e há muito tempo viramos o País dos espertos e só estes têm Justiça. Uma indecência e uma vergonha!
          Eu mesmo não pude prever como essa previsão do senador iria se materializar e voltar-se contra mim de maneira atroz. É o que acontece hoje e começou a acontecer há alguns anos atrás, em torno da ação que movo contra o hoje “espólio” do jornal Gazeta Mercantil, para o qual trabalhei, em doses alternadas, um ano a fio sem receber salário. Foi um horror!
        Os créditos trabalhistas são prioritários, me disseram, e eu tive de descobrir na carne que isso tudo é conversa pra boi dormir.  Cito esse meu exemplo porque sei que milhares e milhares de pessoas vivem – ou vão viver em breve – o mesmo drama pelo qual eu estou passando agora, o de precisar desesperadamente do dinheiro que os tribunais aprisionam sem se importar com o que acontece comigo e com ninguém – ministros do STF e STJ só têm uma única preocupação, e a sociedade brasileira sabe bem qual é, com o próprio bolso.
        Somos, definitivamente, o país dos espertos. O que fizeram o PT e o PSDB em favor de uma Justiça mais ágil, mais justa, mais moderna? Nada, absolutamente nada. Todos só pensam em se eleger, correr atrás de privilégios.
       Posso ser injusto com alguns, mas foram eles que me ensinaram a pensar assim. Todos os dias recebemos novas lições de esperteza. E assim vamos indo, minha ação trabalhista, através da qual sonhava em receber um dinheiro que me permitiria terminar minha vida com um certo conforto está parada nos dois tribunais superiores, sem prazo para voltar a andar.
        A justiça trabalhista até que tentou me ajudar. Com quatro ou cinco anos de tramitação, me foi liberada, por causa do leilão de um imóvel do meu devedor, uma pequena parte do todo reivindicado, mas a espertalhona da minha advogada passou a mão no dinheiro e me deixou a ver navios. Movo três ações contra ela, incluindo um processo pela comissão de ética da OAB. Tudo anda lentamente, mas na ação cível obtive uma boa sentença, recentemente, obrigando a espertalhona a devolver-me uma parte do dinheiro em suaves prestações mensais.
        Oba! Comemorei, ainda sem saber que ela tem direito a recurso. Quando meu advogado me liga para me informar que ela entrou com recurso e vou ter de esperar, por baixo, mais um ano, quase desmaiei... (Esse meu advogado, Pedro Cascaes, é de Blumenau, porque não consegui arranjar um, em SP, que aceitasse trabalhar contra um colega da mesma praça).


 

13/02/2015

Com quem dorme o seu dinheiro?

        Uma agência de publicidade dos EUA lançou essa pergunta há algum tempo atrás e com ela, levando o público a refletir sobre as aplicações escusas que os bancos faziam do dinheiro de poupadores e correntistas, causou uma espécie de comoção nacional, forçando o sistema financeiro de todo o mundo a estabelecer critérios bem mais éticos no destino dado aos recursos que arrebanhava. Foi uma paulada no volume de dinheiro investido na indústria de armas, tabagista, no trabalho escravo, nas fábricas poluidoras, etc.
        Aqui no Brasil deveríamos adquirir o hábito de também pensar em com quem dorme nosso dinheiro. Fiz isso outro dia e adivinhem o que eu descobri? Tenho direito a um dinheiro que dorme com a JUSTIÇA.
        Esse dinheiro está preso numa conta judicial desde 2009; é o resultado final de minha ação trabalhista contra o jornal Gazeta Mercantil; aprisionamos – eu e mais 29 credores trabalhistas – um dinheiro que pertencia ao controlador da Gazeta, em MG, e iniciamos uma demanda judicial pela liberação, alegando, entre várias outras razões, o caráter prioritário das causas trabalhistas.
Ganhamos em 1ª. e 2ª. instância, mas os “ZELOSOS” procuradores do Estado de MG, numa atitude MERAMENTE protelatória, recorreram ao SUPREMO e ao SUPERIOR Tribunal Federal, onde meu dinheiro - e o de milhares de outros brasileiros - costumam dormir o sono profundo da  injustiça.
        É tudo irônico e cruel, muito cruel. Vivemos sob o império do Partido dos Trabalhadores há vários anos. Estou aposentado pelo INSS desde 1998. Minhas contribuições ao INSS sempre foram pelo teto e hoje, descontados alguns empréstimos consignados que fui obrigado a fazer, sobra-me uma micharia que mal dá para comprar remédios.
        E por falar em remédios, minha demanda por eles aumentou drasticamente desde fins de julho de 2013, pois durante uma cirurgia de revascularização, sofri um AVC que me deixou em cadeira de rodas.
        Minha esperança é que as pessoas comecem a refletir e se mobilizem para pressionar os tribunais a ter mais agilidade. E serem simplesmente JUSTOS. Um bom mote para conseguirmos essa mobilização está no título deste artigo, ajudem-nos, pois, a disseminá-lo pela Internet:


- COM QUEM DORME SEU DINHEIRO?

11/02/2015

Comemorem! Malaquias está de volta ao Sax.

        Ele voltou, Malaquias está de volta ao sax e em grande estilo, foi o que descobri com alegria logo depois de me levantar, ainda nesta quinta-feira, dia 5, data em que minha neta, Laurinha, completou 10 meses de vida. Parece que foi ela que ajudou, em orações, para que ele não abandonasse seu instrumento, pois tem paixão por música de qualidade, já dá para perceber. Ele, como disse em texto postado há uns quinze dias – Volta pro sax Malaquias – desentendeu-se com seus colegas e interrompeu os ensaios de sua banda, que nas proximidades do carnaval se reuniam em sua casa para deleite – gratuito – dos vizinhos que, como eu, apreciam boa música instrumental.
        Ainda não sei a que se deve sua volta. Os vizinhos devem especular em cima de algumas hipóteses. Saudade de seu velho companheiro, o sax; negociou com seus colegas um outro local para ensaios; uma mistura dessas duas razões, a hipótese mais provável porque, por enquanto, suas execuções são do tipo “solo” e bem mais rápidas que as anteriores, como se ele fizesse apenas um aquecimento para ensaios em outro lugar.
        Malaquias é um bom vizinho, embora more a poucos metros de casa não me fez nenhuma visita desde que, em julho de 2013, baixei em cadeira de rodas em razão de um AVC que paralisou-me braço e perna direitos; não faz mal, ele recompensa a ausência com boa música.
        Hora dessas, depois do carnaval, vencerei as dificuldades de acesso e darei um pulo até lá, pois, afinal, quando a montanha não vai a Maomé, Maomé tem de ir à montanha, não é mesmo? Assim que cumprir esta promessa relatarei a vocês como foi, e, principalmente, contarei a quantas anda a relação de Malaquias com seu bendito sax.



09/02/2015

Réquiem para José Eduardo Vieira (III de III)

        Havia dois outros bancos ameaçados quando começou, devagarinho, a crise do Bamerindus - o Econômico da Bahia e o Nacional. Não existe nada mais devastador para uma instituição bancária que a especulação da mídia, notinhas nas colunas com credibilidade no meio financeiro, por exemplo, podem decretar a falência de um banco. Até à crise do Econômico e do Nacional a mídia respeitava esse seu poder, e cobria as crises no sistema financeiro com muita cautela. Eu mesmo, como chefe da Sucursal de Curitiba do jornal O Estado de S. Paulo, recebia de vez em quando um telefonema do editor-chefe advertindo: “olha, meu caro, não existe banco ameaçado, crise no sistema financeiro, essas coisas... ignore, esquece”.
        Dizia-se na época, que esses dois bancos ajudaram a empurrar o Bamerindus para a crise. Eles tinham esperança de escapar da intervenção do governo se um terceiro banco importante, que também envolvesse o então presidente FHC, começasse a ruir. O raciocínio tinha lógica: o Econômico era sustentado politicamente pelo senador ACM; o Nacional tinha um dos filhos de FHC numa diretoria importante; e o ministro da Agricultura de FHC era ninguém menos que o presidente do Bamerindus, Andrade Vieira. Esqueceu-se – quem ajudou a alimentar a boataria – que o ministro da economia de FHC era Malan e não o frágil Mântega.
        Cada banco em sua vez sofreu intervenção e o governo FHC continuou seu destino, saindo-se razoavelmente incólume das três crises do sistema bancário.
        O último a ruir, bem depois de Nacional e Econômico, foi o Bamerindus.  Andrade Vieira lamentou até à morte o que ele chamava de grande injustiça que sofreu, e tinha razão. Até alguns meses antes da intervenção – FHC exigiu que ele batesse em retirada, armando sua substituição pelo HSBC – o Bamerindus tinha condições de permanecer vivo. Bastava uma pequena ajuda para que atravessasse a tempestade.
        Minha opinião é que um fator foi decisivo para a derrocada: ele foi obrigado a atravessar a tempestade sem um homem de marketing;  Sérgio Reis, um dos melhores profissionais da área, que criou campanhas memoráveis para o banco, se indispôs com o presidente na antivéspera da crise, e deixou a organização. Exceto Sérgio Reis, a diretoria do banco era o que o que poderia ser chamada de “caramujo”, ou seja, voltada para dentro de si mesma, alheia ao que se passava lá fora, na imprensa, na sociedade. A credibilidade entre os correntistas esvaiu-se em menos de um mês e o banco, sua diretoria, foi incapaz de esboçar uma reação mais articulada.
        E seu presidente, que meses antes deixara o ministério para dar, ao lado de Sérgio Reis e outros famosos marqueteiros de SP, algumas cartadas e ver se seu nome podia decolar para presidente da República havia se recolhido numa de suas fazendas, frustrado, indignado com todos os homens de marketing do Brasil e do mundo. Era então uma ave solitária, havia perdido toda força política junto ao governo.
        O Bamerindus foi vítima, como já disse, das pretensões políticas exageradas de seu dono. Que Deus o tenha.

07/02/2015

Requiem para José Eduardo de Andrade Vieira (II de III)

        Ele não tinha a alma do banqueiro e por isso perdeu seu banco. Agia ao contrário do que agem os banqueiros. Era perdulário, quando os banqueiros são sovinas; confiava excessivamente nas pessoas quando os banqueiros são matreiros, desconfiam da própria mãe; não tinha os olhos de águia, exigência primeira a quem quer fazer política; enfim, deixava-se enganar com facilidade. Era previsível, pois, que perderia tudo, ficando apenas com alguns trocados.
        José Eduardo de Andrade Vieira não nasceu para ter o destino que teve e para receber a herança que recebeu com a queda do Sêneca que matou seus dois irmãos mais velhos, Tomaz e Cláudio, estes sim, dizem, eram preparados para lidar com grandes questões financeiras. “Nos dias de grande tensão, no banco, Tomaz comia bananas que tirava de uma gaveta”, contam jornalistas que o visitaram no trabalho.
        Não era gestor, estava mais para fazendeiro do interior que para líder financeiro; talvez por isso tenha sido um bom ministro da Agricultura, me disseram certa vez alguns criadores de gado do Mato Grosso do Sul. Estive na Fazenda Mitacoré, transformada por ele numa propriedade modelo enquanto presidente do Bamerindus. A Mitacoré, próxima a Foz do Iguaçu, hoje ocupada por agricultores Sem Terra, tinha até uma estação meteorológica completa.        Excursões de agricultores se formavam no Brasil inteiro para visitá-la e poder ver de perto os milagres que os investimentos massivos, bem conduzidos, são capazes de proporcionar à agricultura depositada em terra fértil. A Mitacoré batia recordes de produtividade em trigo, soja, feijão, arroz e tudo mais.
        As fazendas do Bamerindus eram fortes em inovação, tecnologia de ponta. No norte pioneiro do Paraná o banco investiu até mesmo na exploração de diamantes, mas o forte das fazendas nessa região era o reflorestamento à base de pinus, sem poder prever que uma fileirinha de eucalipto, plantada displicentemente em meio às densas florestas de eliotis, seria responsável pela drástica mudança no destino do conglomerado (ver texto anterior).
    Pode-se dizer, em resumo, que o banco ia bem em agricultura, mas quando saía do setor primário começava a bater fora do bumbo.O melhor exemplo disso foi a fábrica de papel plantada no norte pioneiro do Paraná. Depois de anos operando no vermelho, descobriu-se que para reverter a situação da fábrica era necessário alterar drasticamente a tecnologia, ou seja, era necessário, quase, destruí-la para voltar a construi-la com outro padrão tecnológico.

04/02/2015

Réquiem para José Eduardo Vieira ( I de III )

        Morreu esta semana em Curitiba, depois de quase um mês internado em Joaquim Távora, para tratar de uma pneumonia,  José Andrade Vieira, aos 76 anos. Foi o que se pode chamar de um banqueiro sem banco. Foi vítima de pretensões políticas acima da medida – queria ser presidente da República insuflado por uma candidatura bem sucedida ao Senado e foi só. Tinha um senso político meio enviesado e uma dificuldade para separar, entre amigos, o joio do trigo.
        Foi assediado pelo que há de pior tanto na política quanto no setor empresarial do Paraná. Uma frase que eu o ouvi dizer algum tempo depois da nomeação de um empresário para um cargo numa das empresas do grupo Bamerindus explica essa sua inapetência para escolher bem seus companheiros de trabalho: “Pensei que estava contratando um super executivo, e contratei um ladrão”. O problema está no fato que o Paraná inteiro sabia que esse empresário era desonesto, só ele não.
        Saiu da tempestade que arrastou o seu banco para o buraco como um poço de mágoas. Eu o ouvi dizer várias vezes depois que tudo passou: “Chamam esse cara de grande líder da democracia, mas para mim não passa de um FDP. Um FDP, é isso que ele é.”
        Seu destino foi drasticamente alterado, em 1981,  pelo ponteiro de três eucaliptos que roubaram a asa esquerda do Sêneca  onde viajavam seus dois irmãos mais velhos, Tomaz Edison Vieira e Cláudio Enock Vieira, respectivamente o presidente e o vice da já chamada organização Bamerindus, então um complexo de banco, corretora, seguradora, fazendas de agricultura. Com uma só asa, o pequeno aparelho mergulhou de bico numa formação granítica, matando todos seus ocupantes, piloto, os dois dirigentes do conglomerado e seus dois primogênitos. O acidente ocorreu a poucos quilômetros de Tomazina, município a norte pioneiro do Paraná, onde nasceria a antiga cooperativa de crédito que em 1929  dava origem ao Bamerindus.
        Não houve nenhuma controvérsia: o cargo máximo do conglomerado coube a José Eduardo, até então acomodado na presidência de uma corretora do grupo nos Estados Unidos. Eu assisti sua apresentação à imprensa duas ou três semanas após o acidente; houve jornalista que já começou a notar ali que a herança era bem maior que o herdeiro. Eu mesmo não quis fazer previsões; apenas torci para que desse certo. Chegara em 1976 ao Paraná e já conseguia prever o quanto seria devastador para a economia do estado o declínio do Bamerindus.