09/02/2015

Réquiem para José Eduardo Vieira (III de III)

        Havia dois outros bancos ameaçados quando começou, devagarinho, a crise do Bamerindus - o Econômico da Bahia e o Nacional. Não existe nada mais devastador para uma instituição bancária que a especulação da mídia, notinhas nas colunas com credibilidade no meio financeiro, por exemplo, podem decretar a falência de um banco. Até à crise do Econômico e do Nacional a mídia respeitava esse seu poder, e cobria as crises no sistema financeiro com muita cautela. Eu mesmo, como chefe da Sucursal de Curitiba do jornal O Estado de S. Paulo, recebia de vez em quando um telefonema do editor-chefe advertindo: “olha, meu caro, não existe banco ameaçado, crise no sistema financeiro, essas coisas... ignore, esquece”.
        Dizia-se na época, que esses dois bancos ajudaram a empurrar o Bamerindus para a crise. Eles tinham esperança de escapar da intervenção do governo se um terceiro banco importante, que também envolvesse o então presidente FHC, começasse a ruir. O raciocínio tinha lógica: o Econômico era sustentado politicamente pelo senador ACM; o Nacional tinha um dos filhos de FHC numa diretoria importante; e o ministro da Agricultura de FHC era ninguém menos que o presidente do Bamerindus, Andrade Vieira. Esqueceu-se – quem ajudou a alimentar a boataria – que o ministro da economia de FHC era Malan e não o frágil Mântega.
        Cada banco em sua vez sofreu intervenção e o governo FHC continuou seu destino, saindo-se razoavelmente incólume das três crises do sistema bancário.
        O último a ruir, bem depois de Nacional e Econômico, foi o Bamerindus.  Andrade Vieira lamentou até à morte o que ele chamava de grande injustiça que sofreu, e tinha razão. Até alguns meses antes da intervenção – FHC exigiu que ele batesse em retirada, armando sua substituição pelo HSBC – o Bamerindus tinha condições de permanecer vivo. Bastava uma pequena ajuda para que atravessasse a tempestade.
        Minha opinião é que um fator foi decisivo para a derrocada: ele foi obrigado a atravessar a tempestade sem um homem de marketing;  Sérgio Reis, um dos melhores profissionais da área, que criou campanhas memoráveis para o banco, se indispôs com o presidente na antivéspera da crise, e deixou a organização. Exceto Sérgio Reis, a diretoria do banco era o que o que poderia ser chamada de “caramujo”, ou seja, voltada para dentro de si mesma, alheia ao que se passava lá fora, na imprensa, na sociedade. A credibilidade entre os correntistas esvaiu-se em menos de um mês e o banco, sua diretoria, foi incapaz de esboçar uma reação mais articulada.
        E seu presidente, que meses antes deixara o ministério para dar, ao lado de Sérgio Reis e outros famosos marqueteiros de SP, algumas cartadas e ver se seu nome podia decolar para presidente da República havia se recolhido numa de suas fazendas, frustrado, indignado com todos os homens de marketing do Brasil e do mundo. Era então uma ave solitária, havia perdido toda força política junto ao governo.
        O Bamerindus foi vítima, como já disse, das pretensões políticas exageradas de seu dono. Que Deus o tenha.

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