03/12/2014

Martim e Coringa, ausências lamentadas

        Incentivado pelo pai, Rodrigo Mesquita, Martim começou a frequentar a cancha de bocha da Fazenda Barreiros ainda criança; nós, os meus amigos da bocha e que se tornaram amigos de Rodrigo, vimos Martim passar da infância à adolescência, e desta para a juventude, ali, jogando como fiel companheiro do pai; hoje, o menino virou o melhor ponteiro daquela cancha muito agradável, piso de saibro, madeirame robusto e bem implantado,  circundada por árvores de todos os lados e nas quais sempre avistamos esquilos, bugios e uma variedade de pássaros infindável, que nem os saguis - predadores de ovos e ninhos - conseguem exterminar.
        Entenda-se: existem duas especialidades na bocha, a do ponteiro, que rola a bola devagarinho e a faz parar próxima ao balim; e a do atirador, que arremessa a bola com força e expulsa a bola adversária das proximidades do balim. Bom, não preciso dizer que o objetivo do jogo é aproximar as suas bochas do balim e expulsar de perto dele as bochas do adversário. Balim é o nome de uma bola pequena que os jogadores atiram no fundo da cancha antes de iniciar a rodada e se transforma numa espécie de marco regulatório do jogo.
        Voltando ao Martim. Faz tempo que ele não aparece na bocha; assim que atingiu a maioridade seus pais o mandaram estudar fora, no exterior. “Ele é um gênio em Matemática”, dizem os irmãos, com orgulho.
        Lampejos dessa genialidade todos presenciamos na própria bocha; Martim era o único a acompanhar Coringa, auditor contábil, também dono de um raciocínio matemático rapidíssimo, na escalação dos times. Existem duas maneiras de escalar os times que vão disputar os torneios rápidos que se formam numa cancha de bocha quando há muitos jogadores: por pedra numerada colocada dentro de um saco de couro ou tecido ou, mais fácil e rápido, contar os dedos. Funciona assim: cada jogador define um número de dedos com uma das mãos; alguém, então, soma o número de dedos indicados; o valor da soma vai determinando os parceiros. O difícil é pegar atalhos e fazer a contagem rápida, em segundos. Difícil para nós, não para Martim e Coringa.
        Agora, adivinhem porque Edson Gasparotto adquiriu esse apelido - Coringa? Deixemos que ele mesmo nos conte: “Quando eu casei, há uns 20 anos atrás, minha mulher nunca tinha visto um baralho pela frente; com seis meses de casamento, ela já era a “rainha da tranca” em nosso bairro; tudo o que eu já sabia, ensinei para ela. Só largamos há pouco tempo quando comecei a me interessar por música. Hoje, acredito que consegui trocar as máquinas de bingo pelo violão, que toco razoavelmente”.
        A esperança dos amigos é que ele não largue o inofensivo e estimulante jogo de bocha. Ele faz falta em todas as canchas que eu costumava frequentar. É um líder natural do jogo e um inventor de expressões que ficam para sempre em cada cancha por onde passa. Exemplos: quando o seu parceiro - ou adversário - solta um ponto forte demais, Coringa grita “Ei, para onde vai essa vaca louca?”; hoje em dia é comum os jogadores, quando uma bola, também jogada a ponto, passa pelo balim e começa, ainda com força,  a tomar um rumo indesejável, gritarem, em outra invenção do Coringa, “essa vai para o esquisito”.
        São coisas assim que tornam esse jogo apaixonante, uma das atividades que mais me fazem falta hoje, na minha condição de cadeirante. Assim como Martim e Coringa fizeram falta em minha primeira visita, depois que sofri o AVC, à cancha de bocha de Fazenda Barreiros, que eu ajudei a construir há vários anos atrás.


 
(Foto da Cancha de Bocha da Fazenda Barreiro)


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