Quando minha
cadeira de rodas aproximava-se da copa e eu já conseguia identificar algumas
vozes conhecidas, começava a gritar com uma voz o máximo parecida com a voz dos
locutores de rodeio:
A anedota surgiu depois do terremoto havido em Kobe, no Japão, há poucos anos atrás. A história teria ocorrido em Bastos, pequeno município da região de Marília, interior de São Paulo, e onde se concentra uma das maiores populações de descendentes de japoneses do país. Houve um rodeio em Bastos e o locutor, ao anunciar a entrada na arena de um touro bravio, gritou:
- Agooora a terra vai tremer!
A platéia desandou a correr, imaginando tratar-se de um terremoto.
Os encontros de almoço e janta na copa do sétimo andar do prédio do Lucy Montoro, Morumbi, São Paulo, são assim mesmo, cheios de animação. Quando algum de nós faltava a um desses encontros e ninguém sabia as razões, todos se preocupavam. Quando, geralmente o cuidador, que dorme no mesmo quarto do ausente, chegava com a informação de que não ocorrera nada de grave, o alívio era geral. O convívio na copa do sétimo andar é feito também de muita solidariedade.
Isto não era rigoroso, mas cada um de nós tinha um espaço à mesa que todos procuravam respeitar. Meu espaço, por exemplo, era mais próximo da ponta da mesa, à direita de quem entra na copa. À minha frente sentava Sebastião, tetraplégico. Um elevador caiu em cima dele ao visitar a obra de um edifício em companhia do pai. Tinha 14 anos de idade quando sofreu o acidente e hoje tem 22 ou 23 anos, quer dizer, já enfrentou quase dez anos de cadeira de rodas e fisioterapia. Havia entrado no Lucy Montoro há algumas semanas com graves problemas de respiração. Seu cuidador na maior parte do período de internação é seu irmão, Rômulo, que abandonou estudos e o trabalho para se dedicar de corpo e alma a Sebastião. Quando nos conhecemos, ele já respirava normalmente e recuperara o bom humor. “Minha mãe levou esse sem teto lá para casa. Ele está morando com a gente agora”, é o próprio Sebastião falando de seu novo cuidador, um rapaz baixinho, pequeno, que assumiu o posto para dar uns dias de folga a seu irmão. Não cheguei a gravar o nome dele.
A freqüência na copa oscilava de acordo com o regime de internação no Lucy. Toda semana havia despedida de alguém que recebia alta. A amizade, o afeto não desaparecia. Até hoje tenho seguidores no meu Blog de pessoas que conheci no Lucy Montoro e de vez em quando recebo mensagens de alguém que frequentava a copa do sétimo andar. Aqui fora, como acontece comigo, as restrições de mobilidade dificultam as visitas pessoais, mas eu gostaria muito de ser visitado pelos amigos que cultivei lá dentro do Lucy.
O período de internação varia de paciente para paciente e na média dura seis semanas. Se o paciente tiver forte potencial de melhora tem direito a mais uma internação. Já passei por duas internações e não encontrei, na segunda, nenhum amigo que fiz na primeira. Os encontros ocorrem mais ocasionalmente, nas vezes que você vai ao Instituto para uma consulta médica ou avaliação médica. Outro dia mesmo encontrei lá o Reginaldo, um negro alto e muito simpático. Estava em companhia de sua esposa e cuidadora. Ficou paraplégico ao dar um mergulho mal sucedido numa piscina.
Já o seu João, amigo da minha primeira internação, eu vejo com freqüência em praticamente todas as vezes que vou ao Lucy, ele e sua graciosa cuidadora, uma garota de uns 21 anos, de cujo nome não consigo me lembrar. Seu João mora em São Paulo e para ele foi mais fácil optar por outro tipo de atendimento do Lucy, o ambulatorial, com uma programação de fisioterapia sem necessidade de internação. Seu João teve um AVC e em nosso último encontro, há duas semanas, comemorava, feliz, o fato de ter voltado a andar.
- Agooora a terra vai tremer!
Era minha saudação ao companheiro de mesa, o super-simpático Marco Faria.
Quando entrava na copa já havia o clima que desejava encontrar: todos ali
estavam rindo certamente por associar meu grito à anedota que eu mesmo havia
contado à mesa assim que soube que nosso novo companheiro de almoço e jantar
era um peão boiadeiro famoso, premiado em vários rodeios do país, que veio
parar no Lucy Montoro depois de ficar paraplégico por ter sofrido um acidente
de moto na zona rural de sua terra, Itapeva. “Eu já
havia montado os touros mais bravios do país e nunca quebrei um osso. Naquele
dia, véspera de Natal, saí de moto para levar uma leitoa para um amigo e pimba!
trinquei a medula num acidente. Coisa do destino, fazer o que ?” – contou Marco Faria.A anedota surgiu depois do terremoto havido em Kobe, no Japão, há poucos anos atrás. A história teria ocorrido em Bastos, pequeno município da região de Marília, interior de São Paulo, e onde se concentra uma das maiores populações de descendentes de japoneses do país. Houve um rodeio em Bastos e o locutor, ao anunciar a entrada na arena de um touro bravio, gritou:
- Agooora a terra vai tremer!
A platéia desandou a correr, imaginando tratar-se de um terremoto.
Os encontros de almoço e janta na copa do sétimo andar do prédio do Lucy Montoro, Morumbi, São Paulo, são assim mesmo, cheios de animação. Quando algum de nós faltava a um desses encontros e ninguém sabia as razões, todos se preocupavam. Quando, geralmente o cuidador, que dorme no mesmo quarto do ausente, chegava com a informação de que não ocorrera nada de grave, o alívio era geral. O convívio na copa do sétimo andar é feito também de muita solidariedade.
Isto não era rigoroso, mas cada um de nós tinha um espaço à mesa que todos procuravam respeitar. Meu espaço, por exemplo, era mais próximo da ponta da mesa, à direita de quem entra na copa. À minha frente sentava Sebastião, tetraplégico. Um elevador caiu em cima dele ao visitar a obra de um edifício em companhia do pai. Tinha 14 anos de idade quando sofreu o acidente e hoje tem 22 ou 23 anos, quer dizer, já enfrentou quase dez anos de cadeira de rodas e fisioterapia. Havia entrado no Lucy Montoro há algumas semanas com graves problemas de respiração. Seu cuidador na maior parte do período de internação é seu irmão, Rômulo, que abandonou estudos e o trabalho para se dedicar de corpo e alma a Sebastião. Quando nos conhecemos, ele já respirava normalmente e recuperara o bom humor. “Minha mãe levou esse sem teto lá para casa. Ele está morando com a gente agora”, é o próprio Sebastião falando de seu novo cuidador, um rapaz baixinho, pequeno, que assumiu o posto para dar uns dias de folga a seu irmão. Não cheguei a gravar o nome dele.
A freqüência na copa oscilava de acordo com o regime de internação no Lucy. Toda semana havia despedida de alguém que recebia alta. A amizade, o afeto não desaparecia. Até hoje tenho seguidores no meu Blog de pessoas que conheci no Lucy Montoro e de vez em quando recebo mensagens de alguém que frequentava a copa do sétimo andar. Aqui fora, como acontece comigo, as restrições de mobilidade dificultam as visitas pessoais, mas eu gostaria muito de ser visitado pelos amigos que cultivei lá dentro do Lucy.
O período de internação varia de paciente para paciente e na média dura seis semanas. Se o paciente tiver forte potencial de melhora tem direito a mais uma internação. Já passei por duas internações e não encontrei, na segunda, nenhum amigo que fiz na primeira. Os encontros ocorrem mais ocasionalmente, nas vezes que você vai ao Instituto para uma consulta médica ou avaliação médica. Outro dia mesmo encontrei lá o Reginaldo, um negro alto e muito simpático. Estava em companhia de sua esposa e cuidadora. Ficou paraplégico ao dar um mergulho mal sucedido numa piscina.
Já o seu João, amigo da minha primeira internação, eu vejo com freqüência em praticamente todas as vezes que vou ao Lucy, ele e sua graciosa cuidadora, uma garota de uns 21 anos, de cujo nome não consigo me lembrar. Seu João mora em São Paulo e para ele foi mais fácil optar por outro tipo de atendimento do Lucy, o ambulatorial, com uma programação de fisioterapia sem necessidade de internação. Seu João teve um AVC e em nosso último encontro, há duas semanas, comemorava, feliz, o fato de ter voltado a andar.
(Marco Faria montado em charrete)
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