Deus! ó Deus! onde estás
que não respondes? Em que mundo, em qu'estrela tu t'escondes embuçado nos céus? Há dois mil anos te mandei meu grito, que embalde
desde então corre o infinito... Onde estás, Senhor Deus?...
Não há como não lembrar de Castro Alves,
em seu memorável “Vozes d’África", ao assistirmos ao drama desses povos que
partem em embarcações precárias em busca de vida digna em outro continente; a
impressão é que Deus esqueceu-se mesmo
dessa gente !
Aquela imagem do menino sírio encontrado
morto na praia está armazenada na minha
alma sem tempo para se apagar. Era tão pequeno o menino, tinha apenas dois anos
de vida, e fora arrastado pela família para seguirem ao encontro da morte em
mar revolto. Só mesmo o Holocausto ou a Guerra do Vietnã para produzir cenas de
tanta
crueldade. Guerras, pobreza, repressão política e religiosa são alguns
dos motivos que fazem milhares de pessoas saírem de seus países – Síria,
Eritréia, Afeganistão – em busca de uma vida melhor no continente europeu.
Nilüfer Demir, uma fotógrafa da imprensa turca, fotografava um grupo de imigrantes
paquistaneses na praia quando encontrou o corpo sem vida de Alan Kurdi. Ela
mesma não soube prever que sua foto provocaria tanta comoção no mundo.
Refúgio
da crueldade, só agora os governos dos países ricos da União Européia começam a
ter alguma sensibilidade para perceber o drama desses refugiados; começam a
abrir as fronteiras contando cada pessoa que entra em território nacional como
se contam animais prontos para abate.
Não
deveria ser assim. Gente não é bicho, gente faz falta, principalmente nesses
países velhos, que há muito tempo não crescem mais. E sabem por que não crescem?
Porque o consumo não cresce. Sabem por que o consumo não cresce? Porque falta gente
para consumir.
A
tese do antropólogo paulista José Almeida Marins Filho é justamente esta: os
velhos países do Velho Continente vão um dia ter de “importar” consumidores
para resolver seus problemas de estagnação econômica. Deveriam pois receber
essas famílias deserdadas por suas pátrias de braços abertos, como quem recebe
uma dádiva divina e não como quem recebe uma maldição.
Talvez
a morte do pequeno Alan Kurdi não tenha sido em vão. É provável que o
sacrifício de Alan tenha servido para mostrar que as fronteiras não podem ter
mais tanta rigidez, a ponto de afastarem das pessoas a compaixão. Viver sem
compaixão serve para que? Pergunta que deveria ser respondida também por aqueles
que reagem com ódio e virulência contra a presença de haitianos em solo
brasileiro, uma estupidez bem casada com a mais torpe das ignomínias.
(Foto Nilüfer Demir)
Excelente texto! Concordo em muito com ele. Sejamos mais humanos e menos julgadores, pois quem tem tempo para julgar não tem tempo para amar (Madre Teresa).
ResponderExcluirObrigado, Sandro. A caravana passa, mas é dolorido vermos a reação das pessoas que parecem ter saído do inferno, como daquela cinegrafista que derrubou um refugiado que segurava uma criança de colo e distribuiu chutes e pontapés em todos que passavam. Mais próxima de nós, em Londrina, no Paraná, uma moça atirou uma banana a um senegalês, cujo único pecado é a cor da pele. Evamos em frente que atrás vem gente !
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