11/05/2015

Luz no fim do túnel?

Entre os jornais impressos figura o especializado em economia, Valor Econômico, lançado há uns 20 anos atrás, com capital subscrito por dois jornalões de interesse geral – Folha de São Paulo e o Globo –, este pertencente ao mesmo grupo da líder em audiência TV Globo. É recomendável a todos prestar bastante atenção no Valor, de baixa tiragem, mas que, ao que tudo indica, tem sido usado pelos seus donos para publicar aquilo que eles não têm coragem de divulgar.
Um bom exemplo dessa manobra surgiu em meio à cobertura da Operação Lava Jato. Só o Valor publicou a única matéria digna e completa sobre a libertação dos executivos das empreiteiras envolvidas no escândalo de Petrobras. Eu não assino o Valor, mas amigos atentos, como o jornalista Mauro Bastos, hoje vivendo em Itajaí, Santa Catarina, sempre me envia o que o jornal publica de melhor. Sempre que acho conveniente compartilho com meus leitores o material que recebo, como esse, magnífico (como diria Millôr Fernandes, jornal é isso. O resto é armazém de secos e molhados):


Teori, Toffoli e Gilmar vão conter Moro
Por Juliano Basile
De Brasília

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de libertar da prisão nove executivos que foram presos pela Operação Lava-Jato começou a ser configurada há 50 dias com a ida do ministro José Antonio Dias Toffoli para a 2a Turma da Corte — justamente a responsável por julgar os recursos contra a operação.
Um dos mais calados durante o julgamento, Toffoli ajudou a consolidar a maioria de três votos a dois que libertou o líder do suposto cartel das empreiteiras, o presidente da UTC, Ricardo Pessoa, e mais oito executivos.
O tom jurídico do julgamento foi dado pelo relator, ministro Teori Zavascki, para quem as prisões não podem ser alongadas se a maioria dos procedimentos de apuração de crimes — coleta de documentos e oitiva de testemunhas de acusação — já foi realizada.E o tom político foi dado pelo ministro Gilmar Mendes, que comparou o escândalo da Petrobras com os desvios ocorridos no mensalão.
Foi Mendes quem propôs, em 10 de março passado, que um integrante da 1a. Turma do STF fosse enviado à 2a. Turma para completar o quórum antes da indicação de um novo ministro pela presidente Dilma Rousseff e, com isso, evitasse que a nomeação viesse aliada ao fato de que o escolhido iria julgar a Lava-Jato.
Uma semana depois, Toffoli, que, nos últimos meses, votou junto com Mendes em diversas questões importantes tanto no STF como no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), estava na 2ª Turma. Esse trio de ministros — Zavascki, Toffoli e Mendes — formou a maioria de votos que vai conduzir os caminhos da Operação Lava-Jato na 2ª Turma. Trata-se de uma maioria não eventual que vai conter os atos do juiz Sérgio Moro, responsável pelos autos da Lava-jato, em Curitiba. Moro terá os seus atos reapreciados pelo STF, onde esse trio de ministros poderá corrigir os seus rumos.
A expectativa é a de que essa correção não se restrinja aos nove habeas corpus concedidos na última terça-feira, pois há uma diferença entre as concepções de Justiça de Moro e a dos ministros que formaram a nova maioria nos autos da Lava-Jato e ela certamente terá repercussões em novos julgamentos.
Enquanto o juiz de Curitiba acredita que o bem maior, numa decisão, é a proteção da sociedade contra os criminosos, a maioria que foi formada na 2a Turma do STF entende que o que deve ser observado são as garantias e os direitos individuais dos acusados. Foi nesse sentido que Zavascki, Toffoli e Mendes concederam os habeas corpus, deixando vencidos os ministros Celso de Mello e Cármen Lúcia Antunes Rocha, que concluíram que deixar Pessoa solto poderia abrir espaço para que o Executivo atuasse de modo a comprometer o andamento das investigações.
O impacto da concessão dos nove habeas corpus será imenso na Lava-Jato. A decisão reduziu muito as chances de a Operação ter novas delações premiadas de executivos que detêm informações sobre os desvios de bilhões de reais ocorridos na Petrobras. Uma vez soltos, os incentivos para que eles colaborem se tornaram bem menores. Em consequência, o trabalho do Ministério Público e da Polícia Federal será maior. As autoridades terão que continuar seguindo o caminho do dinheiro, examinando provas, ouvindo depoimentos e redigindo as peças capazes de levar a condenações, sem um delator-chave capaz de revelá-lo de imediato.
Caso Pessoa contasse às autoridades o que sabe, a expectativa é a de que a Lava-Jato teria um enorme avanço em termos de provas e de tempo. Se com base em duas delações — do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa e do doleiro Alberto Youssef — o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, indiciou mais de 50 políticos ao STF, a tendência é a de que a colaboração de um dos líderes do cartel não apenas reforçasse ainda mais as provas já colhidas como abrisse espaço para novos indiciamentos.
Outra consequência da decisão é que aumentam as chances de prescrição, já que o tempo para as autoridades apurarem os crimes será mais extenso.
Por fim, sem a assinatura de novas delações, o Ministério Público e a Polícia Federal continuarão com os advogados dos executivos que foram soltos como fortes adversários. Eles devem permanecer contestando cada ato da acusação e o farão de maneira exaustiva.
Segundo um levantamento apresentado, em 20 de março, pelo procurador Deltan Dallagnol, que coordena a força-tarefa da Lava-Jato, em Curitiba, a defesa dos acusados apresentou mais de 165 pedidos de habeas corpus e para cada um deles há seis chances de julgamento em vários tribunais.
Uma vez soltos e sem a assinatura de novos acordos de delação, os acusados terão todas as condições para aumentar ainda mais esse número. E, agora, contam com maioria eventual no STF para corrigir os rumos a serem tomados pelo juiz que conduz os autos da Operação.
A decisão foi a maior vitória dos acusados desde o início da Lava-Jato.


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