06/12/2014

Taraira, correndo com esperança de não alcançar

        Tomada era um crioulo forte, alto e carrancudo que alguns anos antes de ser morto a tiros pela polícia de Valinhos refugiou-se no Bar do Paiol, como fazem muitos outros exemplares dessa “fauna” de alcoólatras, desocupados, ficha suja na polícia. É gente solitária, triste, desesperançada e que encontra nesse bar sossego, alguém que lhes pague um sanduíche de mortadela e algumas doses de cachaça ao dia. Ali dormem, bebem e comem, sem dever nada a ninguém, a não ser um ou outro favor aos donos, que pagam ao escorrer do tempo, sem cobranças e sem chateação.
        Taraira e Zé são os donos do Paiol, ou melhor, donos do prédio onde funciona o bar, arrendado a terceiros há vários anos porque nenhum dos dois  aguentava mais tanta chateação na lida diária com pinguços e desocupados. Até há uns três anos atrás os  donos do prédio seguravam o rojão, reclamavam muito da vida mas, seguravam.
        Taraira era amigo de Tomada e os dois viviam aprontando poucas e boas um com o outro; um dia Tomada exagerou na dose e Taraira se irritou. Saiu correndo atrás do amigo com intenção de dar-lhe uma boa surra. Taraira conta: “naquele dia, perdi a cabeça; saí no encalço dele e fui levá-lo até a praça lá da frente; na verdade, rezei para não alcançar, porque ele é muito maior que eu e se alcanço ele teria me espancado...”
        Taraira e Zé conheceram de perto, e por várias vezes, a terrível morte por alcoolismo. Taraira fazia um risco no corote de madeira, sempre cheio de cachaça, para cada cliente do Paiol que sucumbia. Uma vez vi-o comentando com amigos: “Ou esse pessoal para de morrer ou teremos que comprar um corote novo, nesse daí não tem mais espaço para eu fazer os meus risquinhos”.


(Corote, Tonel de Carvalho)

Nenhum comentário:

Postar um comentário